24/09/2013

VI CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS EM SAÚDE

Entrevistas concedidas nos Grandes Debates (13 a 17 de setembro, RJ) 

Sérgio Carrara

Cientista Social formado pela Unicamp e doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional, éhttp://www.abrasco.org.br/UserFiles/Image/Carrara_lappisSET13.jpgprofessor associado da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), coordenador do Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos (CLAM/IMS/Uerj) e membro do Laboratório Integrado em Diversidade Sexual e de Gênero, Políticas e Direitos (LIDIS/Uerj)



Abrasco: Qual é a importância de se debater as formas de discriminação social e suas repercussões na saúde?


Sérgio Carrara: Se tomarmos o conceito de saúde como definido pela OMS, que abarca o completo bem-estar físico-psíquico e social, não é possível ser saudável sendo alvo de preconceitos. Parece uma banalidade discutir esses impactos, mas, em certo sentido, é uma abordagem relativamente nova em termos de estudos mais sistemáticos, seja nas tentativas de quantificação como na produção de pensamentos mais refinados sobre esses impactos. Há vários planos nos quais o preconceito apresenta essa dimensão. A violência física é o mais imediato, mas há também a negligência. O preconceito pode matar diretamente, como pode também deixar morrer. Isto tem a ver diretamente com o sistema de saúde: como elas são acolhidas e atendidas nesse serviço e como as pessoas se dispõem ou evitam a procurar ajuda, por medo ou antecipação de posições preconceituosas e descriminadoras.



Abrasco: No debate da homossexualidade, ainda encontra-se forte os discursos acerca dos grupos de risco. Como o senhor vê este tema na perspectiva de uma saúde mais inclusiva?


Sérgio Carrara: Independentemente do conceito e dos debates acerca dos grupos de risco, desenhe-se no horizonte o silenciamento, ou seja, uma outra forma do preconceito na qual se nega a existência de um problema. Digo isso pois nem as ações do Ministério da Saúde em prol da prevenção de doenças entre homens que fazem sexo com homens, como é apresentado pela terminologia oficial, estão acontecendo, tendo em vista que foi suspensa a campanha sobre o uso de preservativos que mostrava a troca de olhares entre dois homens.



Abrasco:  Qual é a importância da Academia e das suas entidades científicas, como a Abrasco, debaterem os grandes temas sociedade em seus encontros, como no VI Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde?


Sérgio Carrara: O discurso da saúde é poderoso em vários planos, pois lida com questões que tocam imediatamente na vida das pessoas e aos interesses do Estado e dos governos. O Congresso de Ciências Sociais e Humanas em Saúde da Abrasco será uma oportunidade para o campo da Saúde Coletiva se posicionar em relação a esses temas que estão na ordem do dia. O direito das mulheres e a questão do aborto aponta um retrocesso, com posições que vão se consolidando e ganhando espaço no Congresso Nacional, como a tentativa de acabar com o que já havia-se conquistado em termos do aborto legal. Um tema já consensuado no debate da saúde, pois é fácil mapear o número de mulheres internadas por conta de complicações com abortos ilegais, um número imenso. Já as questões relativas à homofobia trazem dados mais imprecisos, não se consegue medir tão claramente os números da violência, mas está aí, nas escolas e nos serviços de saúde. O debate LGBT em saúde é um debate em gestação e este é o momento para que esta questão seja melhor trabalhada em busca de ações mais democráticas.

 

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SUA SEXUALIDADE É ASSUNTO SEU, SUA SAÚDE É ASSUNTO NOSSO!


Mulheres lésbicas e bissexuais sentem-se inibidas em procurar ajuda do ginecologista. Revelar nossa intimidade num contexto social de enorme preconceito não é uma tarefa fácil. E ainda existe o medo do uso dos aparelhos (como o espéculo) para aquelas que não sofrem penetração nas suas relações sexuais.


Embora não seja possível estimar quantas vão aos consultórios, pois não existe a possibilidade de informação da orientação sexual no prontuário médico, apontamos para a falta de um espaço adequado para dialogarmos sobre nossas dúvidas e práticas sexuais.

A falta de acolhimento por parte do corpo de profissionais de saúde na rede pública, somadas ao medo da rejeição e ao preconceito efetivamente existente, faz com que muitas dentre nós saiamos dos consultórios com recomendações para usar pílulas anticoncepcionais ou camisinhas masculinas.

Sem orientação adequada algumas acham que só desenvolvem câncer de útero mulheres quem têm relações heterossexuais, deixando de prestar atenção a um fator de aumento de risco para aquelas que nunca tiveram uma gravidez e desconsiderando a necessidade de fazerem os exames e a prevenção de DSTs/AIDS.

Temos necessidade de efetivar o plano nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) e assegurar a assistência ginecológica de qualidade e atenção à saúde integral em todas as fases da vida para todas as mulheres, sejam lésbicas, bissexuais, transexuais ou heterosexuais.

No consultório médico não entra o preconceito e ali TODAS SÃO BEM VINDAS!

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Principais Resultados da Pesquisa

  • Pesquisa revela tensão, por parte dos médicos, entre a noção de homossexualidade como distúrbio hormonal ou doença psíquica e a necessidade de aderir a um discurso “politicamente correto” de não discriminação.

  • No caso das mulheres os dados indicam que a saúde em geral é um tema delicado porque envolve experiências de discriminação e expectativas de desconforto, particularmente em relação à consulta ginecológica.

  • As mulheres mais masculinas tendem a evitar os médicos, recorrendo aos serviços de saúde, em geral, apenas nas situações em que se percebem incapacitadas para o trabalho ou para realizarem atividades cotidianas.

  • A abordagem das questões de prevenção faz pouco sentido para as entrevistadas lésbicas porque elas não percebem riscos nas suas práticas sexuais. Além disso, o tema desperta tensões no que diz respeito ao imperativo da fidelidade conjugal e a própria afirmação de uma identidade lésbica.

  • Há um pacto de silêncio a respeito da homossexualidade: os profissionais não falam sobre este assunto por medo de invadir a privacidade ou discriminar as pacientes, ou simplesmente porque não se sentem capacitados (tecnicamente) para abordar o assunto.

  • Já as mulheres têm receio de serem tratadas com distinção e alimentam dúvidas quanto à necessidade dessa informação durante a consulta, o que as faz silenciar sobre sua orientação e práticas sexuais.
  • O Resultado disso é uma consulta impessoal, que não reconhece a diferença das mulheres lésbicas e bissexuais, com pacientes acuadas pelo medo da discriminação explícita e um silêncio de ambas as partes que afasta as mulheres lésbicas, sobretudo as mais masculinizadas dos consultórios do SUS.

  • As consultas não raro resultam em receitas de contraceptivos e indicação de uso de camisinhas masculinas, o que faz com que as mulheres, invisibilizadas, não retornem ao consultório médico.


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