24/09/2013

PALAVRA DA PRESIDENTE: Maria do Socorro de Souza


Assessora de Políticas Sociais da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag), Maria do Socorro é a primeira mulher e usuária do Sistema Único de Saúde a ocupar a presidência do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

 

Abrasco: Desde o início das manifestações de Junho, as pautas e temas relacionados à saúde ganharam visibilidade como nunca antes no Brasil. O debate saiu da fila do SUS e agora abarca outras questões. Como a senhora percebe essa ampliação no debate social?



Maria do Socorro:  As mobilizações de junho mostraram que o efeito do SUS na vida do povo brasileiro, após 25 anos de sua implementação, é menor do que o esperado. Ao clamarem por uma saúde padrão FIFA mostram que - apesar da conquista legal da saúde como dever do Estado e direito de todos cidadãos - , vivemos no dia a dia muitas dificuldades para garantir esse direito. A conjuntura favoreceu esse destaque da saúde na agenda da sociedade, do governo,  do Congresso Nacional e da mídia, ainda que a partir de temas emergenciais, como o Programa Mais Médico e Mais Saúde; polêmicos e complexos, como a Lei do Ato Médico; alguns de cunho conservador, como a internação compulsória, a cura gay e o Estatuto do Nascituro; e outros importantes para o resgate da credibilidade e legitimidade do SUS perante a sociedade, como o Serviço Civil Obrigatório,  a Lei de Responsabilidade Sanitária e a Lei de Iniciativa Popular por 10% da Receita Corrente Bruta da União. Contudo, a velha saga por que passa diariamente a população continua no campo da assistência médica, consagrada pelas filas presenciais e virtuais nos pronto-socorros, ambulatórios e hospitais, mostrando como ainda é baixa capacidade da gestão pública em responder de forma resolutiva às demandas de saúde da população.



Abrasco - Como a sociedade civil e os poderes republicanos podem e devem enfrentar os gargalos da saúde em nosso país?

 

Maria do Socorro:  As ruas mostraram que a saúde deve ser tratada pelo Estado e pela sociedade brasileira como prioridade nacional, e que sua solução passa pelo resgate da credibilidade e legitimidade do SUS, pela afirmação da saúde como política social importante para o desenvolvimento do país e para o pacto de democracia e cidadania brasileira. Superar as antigas heranças,  os limites impostos pela política econômica do país, e apontar soluções definitivas para consolidar o SUS exige determinação política dos poderes republicanos nos três níveis, em especial do governo federal e do Congresso Nacional. Significa encontrar solução para um financiamento  adequado, formulação e implementação de plano de cargos, carreiras e salários para os profissionais de saúde, e uma qualificação para que a gestão pública seja eficiente, transparente e democrática de modo a combater a corrupção e todas formas de privatização. Mas uma condição para isso é certa: a permanente mobilização e a pressão popular.



Abrasco - Qual é a importância da Academia (entendendo-a pela comunidade de professores, pesquisadores e estudantes) e das suas entidades científicas, como a Abrasco, debaterem os grandes temas sociedada brasileira em seus encontros, como é o caso do VI Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde?

 

Maria do Socorro: A produção do conhecimento no setor saúde por entidades como a Abrasco, CEBES, Sociedade Brasileira de Bioética, Rede Unida, Fiocruz, dentre tantas outras,  tem contribuído para fundamentar e qualificar a  luta política  em defesa do SUS e para o avanço do desenvolvimento científico e tecnológico do setor. Isso é possível porque essas entidades científicas têm assumido postura crítica, autônoma  e propositiva frente às medidas governamentais. Sua contribuição, contudo, ganha maior envergadura a medida que rompem os muros do academicismo e ganham capilaridade junto às organizações de trabalhadores da saúde, movimentos sociais, setores populares.  É necessário articular esses temas e dele produzir ações no interior das esferas do controle social da saúde, para assim ajudar a superar as contradições e as tensões da luta política no dia-a-dia, fazendo valer o interesse público e a satisfação das necessidades de saúde do povo brasileiro.

 


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SUA SEXUALIDADE É ASSUNTO SEU, SUA SAÚDE É ASSUNTO NOSSO!


Mulheres lésbicas e bissexuais sentem-se inibidas em procurar ajuda do ginecologista. Revelar nossa intimidade num contexto social de enorme preconceito não é uma tarefa fácil. E ainda existe o medo do uso dos aparelhos (como o espéculo) para aquelas que não sofrem penetração nas suas relações sexuais.


Embora não seja possível estimar quantas vão aos consultórios, pois não existe a possibilidade de informação da orientação sexual no prontuário médico, apontamos para a falta de um espaço adequado para dialogarmos sobre nossas dúvidas e práticas sexuais.

A falta de acolhimento por parte do corpo de profissionais de saúde na rede pública, somadas ao medo da rejeição e ao preconceito efetivamente existente, faz com que muitas dentre nós saiamos dos consultórios com recomendações para usar pílulas anticoncepcionais ou camisinhas masculinas.

Sem orientação adequada algumas acham que só desenvolvem câncer de útero mulheres quem têm relações heterossexuais, deixando de prestar atenção a um fator de aumento de risco para aquelas que nunca tiveram uma gravidez e desconsiderando a necessidade de fazerem os exames e a prevenção de DSTs/AIDS.

Temos necessidade de efetivar o plano nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) e assegurar a assistência ginecológica de qualidade e atenção à saúde integral em todas as fases da vida para todas as mulheres, sejam lésbicas, bissexuais, transexuais ou heterosexuais.

No consultório médico não entra o preconceito e ali TODAS SÃO BEM VINDAS!

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Principais Resultados da Pesquisa

  • Pesquisa revela tensão, por parte dos médicos, entre a noção de homossexualidade como distúrbio hormonal ou doença psíquica e a necessidade de aderir a um discurso “politicamente correto” de não discriminação.

  • No caso das mulheres os dados indicam que a saúde em geral é um tema delicado porque envolve experiências de discriminação e expectativas de desconforto, particularmente em relação à consulta ginecológica.

  • As mulheres mais masculinas tendem a evitar os médicos, recorrendo aos serviços de saúde, em geral, apenas nas situações em que se percebem incapacitadas para o trabalho ou para realizarem atividades cotidianas.

  • A abordagem das questões de prevenção faz pouco sentido para as entrevistadas lésbicas porque elas não percebem riscos nas suas práticas sexuais. Além disso, o tema desperta tensões no que diz respeito ao imperativo da fidelidade conjugal e a própria afirmação de uma identidade lésbica.

  • Há um pacto de silêncio a respeito da homossexualidade: os profissionais não falam sobre este assunto por medo de invadir a privacidade ou discriminar as pacientes, ou simplesmente porque não se sentem capacitados (tecnicamente) para abordar o assunto.

  • Já as mulheres têm receio de serem tratadas com distinção e alimentam dúvidas quanto à necessidade dessa informação durante a consulta, o que as faz silenciar sobre sua orientação e práticas sexuais.
  • O Resultado disso é uma consulta impessoal, que não reconhece a diferença das mulheres lésbicas e bissexuais, com pacientes acuadas pelo medo da discriminação explícita e um silêncio de ambas as partes que afasta as mulheres lésbicas, sobretudo as mais masculinizadas dos consultórios do SUS.

  • As consultas não raro resultam em receitas de contraceptivos e indicação de uso de camisinhas masculinas, o que faz com que as mulheres, invisibilizadas, não retornem ao consultório médico.


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