dificulta prevenção e tratamento de doenças
Fernanda Aranda, iG São Paulo
Câncer de mama, obesidade, HPV e uso de drogas são problemas que
ameaçam a saúde feminina e, segundo pesquisas recentes, as lésbicas
correm ainda mais risco de cruzar o caminho com estas doenças.
Veja também: Mulheres que mudam de sexo
A mistura de preconceito, falta de informação e despreparo das equipes
de saúde para tratar esta população é o ponto de partida para que
mulheres que fazem sexo com mulheres concentrarem indicadores de saúde
piores do que a população feminina em geral.
Os estudos científicos já evidenciaram que a vergonha das pacientes em
expor algumas partes do corpo relacionadas à sexualidade, como as
mamas e a vagina, também compõem o cenário da dificuldade das
homossexuais em cumprir uma agenda preventiva às doenças.
Os números
A primeira grande publicação que alertou sobre os índices de saúde
preocupantes na população lésbica foi feita pela Universidade de
Pittsburgh e publicada no Arquivo Internacional de Saúde Pública.
Os médicos entrevistaram 1.017 mulheres homossexuais. Na avaliação
comparativa com as heterossexuais, eles encontraram 35,5% de lésbicas
fumantes contra 20,5% heteros. No primeiro grupo 57,5% usavam álcool
com frequência contra 44,6% na outra turma (o índice de alcoolismo
ficou 4,7% contra 1,1%).
Além disso, na faixa etária com mais de 40 anos, 93,3% das lésbicas
nunca haviam feito mamografia frente ao índice de 85,1% da outra
população. Como complemento desta pesquisa, a Sociedade Canadense de
Câncer fez uma divulgação alertando que a mulher heterossexual visita
o médico com frequência para ter acesso aos anticoncepcionais, um
"privilégio" não vivenciado pelas mulheres gays. Sem passar por tantas
consultas, as lésbicas não têm o colesterol e a pressão arterial
avaliados com tanta recorrência, o que compromete a rotina preventiva.
Cenário nacional
No Brasil, o governo federal já sinalizou sobre a importância de
aproximar as lésbicas dos serviços de saúde e, para isso, o
acolhimento por parte da equipe é fundamental. Em um documento oficial
distribuído para todos os Estados em 2007, os técnicos escreveram que
o grupo das lésbicas e bissexuais permanece invisível nas estratégias
de saúde.
"Muitos/as profissionais da rede de saúde têm dúvidas sobre o manejo
do atendimento e encaminhamentos, justamente por reproduzir o modelo
da heterossexualidade, nos seus campos de intervenção, cuidado e
controle da saúde das mulheres", escreveram. "O resultado dessa
cultura é a permanência e a ampliação dos contextos de vulnerabilidade
de mulheres que, quando recorrem aos serviços, não são orientadas
adequadamente para o exercício da sexualidade autônoma, segura e
protegida."
Alexandre Bôer, diretor do grupo do Rio Grande do Sul Somos
(Comunicação, Saúde e Sexualidade) explica que pelo fato de não terem
relações sexuais com penetração, as orientações sobre doenças
sexualmente transmissíveis são praticamente inexistentes. Uma das
consequências é que as lésbicas acabam por acreditar que não correm
nenhum risco de contágio.
"Os grupos de mulheres lésbicas de todo País têm trabalhado muito as
informações sobre HIV, aids e HPV. Primeiro porque quase todas as
mulheres que estão em um relacionamento com outra mulher hoje já
tiveram relações com homens no passado e podem ter sido contaminadas.
Um outro motivo é que uma boa parte das doenças sexualmente
transmissíveis (como sífilis e gonorreia, e outras verrugas e
infecções que podem não vir com sintoma nenhum) acomete estas
mulheres, a contaminação é fácil."
Outro aspecto que precisa ser trabalhado, avalia Bôer, é que exames
para colher o papanicolaou podem ser considerados invasivos demais
para mulheres que não têm penetração sexual ou são virgens. "Todos os
exames médicos que mexem de alguma forma com a sexualidade precisam
ser trabalhados, independentemente da orientação sexual. Os homens
heterossexuais, por exemplo, têm muita restrição em fazer o toque
retal. Algumas lésbicas podem ter restrições ou receios. Tudo isso
precisa ser conversado abertamente com o médico, sem preconceito."
Efeito psicológico
A psiquiatra especializada em dependência química da Unifesp,
Alessandra Diehl, também já fez levantamentos e revisões de literatura
especializada e encontrou em evidências internacionais que apontam
maior uso de substâncias psicoativas entre as lésbicas.
"No Brasil, elas são pouco estudadas, mas sabemos que nas unidades de
internação precisamos trabalhar a homofobia. O que percebemos é que
nestes contextos, elas são muito acolhidas, mas isso precisa ser
universal", diz.
Uma das justificativas é que esta população enfrenta muito preconceito
e uma das vias de fuga seriam as drogas. A mesma explicação pode ser
aplicada para o fato das lésbicas conviverem com mais obesidade,
conforme mostrou pesquisa feita Universidade de Saúde Pública dos
Estados Unidos. Análise feita com 6.000 mulheres indicou que as
lésbicas tinham 2,69 vezes mais risco de estar acima do peso e 2,47
vezes de serem obesas.
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